sexta-feira, 6 de maio de 2011

CARTA por Carlos Drummond de Andrade

   CARTA

Há muito tempo, sim, não te escrevo.
Ficaram velhas todas as notícias.
Eu mesmo envelhecí: olha em relevo
estes sinais em mim, não das carícias

(tão leves) que fazias no meu rosto:
são golpes, são espinhos, são lembranças
da vida a teu menino, que a sol-posto
perde a sabedoria das crianças.


A falta que me fazes não é tanto
à hora de dormir, quando dizias
"Deus te abençoe", e a noite abria em sonho.


É quando, ao despertar, revejo a um canto
a noite acumulada de meus dias,
    e sinto que estou vivo, e que não sonho.


Referência:

ANDRADE. Carlos Drummond de.  Poesia e prosa.  Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 1988.




2 comentários: