terça-feira, 29 de janeiro de 2013

"OS SINOS" por Manuel Bandeira


 
 
Sino de Belém,
Sino da Paixão...


Sino de Belém,
Sino da Paixão...


Sino do Bonfim!...
Sino do Bonfim!...


Sino de Belém, pelos que inda vêm!
Sino de Belém bate bem-bem-bem.


Sino da Paixão, pelos que lá vão!
Sino da Paixão, bate bão-bão-bão.
Sino do Bonfim, por quem chora assim?...


Sino de Belém, que graça ele tem!
Sino de Belém bate bem-bem-bem-bem.


Sino da Paixão - pela minha mãe!
Sino da Paixão - pela minha irmã!


Sino do Bonfim, que vai ser de mim?...


Sino de Belém, como soa bem!
Sino de Belém, bate bem-bem-bem.


Sino da Paixão... Por meu pai?... - Não! Não!...
Sino da Paixão bate bão-bão-bão.


Sino do Bonfim,  baterás por mim?


Sino de Belém,
Sino da Paixão...
Sino da Paixão, pelo meu irmão...


Sino da Paixão,
Sino do Bonfim...
Sino do Bonfim, ai de mim, por mim!


Sino de Belém, que graça ele tem!


 
 
Manuel Bandeira

sábado, 12 de janeiro de 2013

TREM DE FERRO por Manuel Bandeira


Café com pão
Café com pão
Café com pão
 
Virge Maria, que foi isso maquinista?
 
Agora sim  
Café com pão
Agora sim
Voa, fumaça
Corre, cerca
Ai seu foguista
Bota fogo
Na fornalha
Que eu preciso
Muita força
Muita força
Muita força
Oô...
 
Foge, bicho
Foge, povo
Passa ponte
Passa poste
Passa pasto
Passa boi
Passa boiada
Passa galho
Da ingazeira
Debruçada
No riacho
Que vontade
De cantar!
Oô...
 
Quando me prendero
No canaviá
Cada pé de cana
Era um oficiá
Oô...
 
Menina bonita
Do vestido verde
Me dá tua boca
Pra matar minha sede
Oô...
 
Vou mimbora vou mimbora
Não gosto daqui
Nasci no sertão
Sou de Ouricuri
Oô...
 
Vou depressa
Vou correndo
Vou na toda
Que só levo
Pouca gente
Pouca gente
Pouca gente...
 
Manuel Bandeira
 
 

quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

TIMIDEZ por Cecília Meireles


Basta-me um pequeno gesto, 
feito de longe e de leve, 
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve...



— mas só esse eu não farei.




Uma palavra caída
das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras mais distantes...




— palavra que não direi.




Para que tu me adivinhes, 
entre os ventos taciturnos, 
apago meus pensamentos, 
ponho vestidos noturnos, 




— que amargamente inventei.




E, enquanto não me descobres, 
os mundos vão navegando
nos ares certos do tempo, 
até não se sabe quando...




— e um dia me acabarei.

Cecília Meireles
Fonte: Jornal de Poesia